Festas Regionais

Autor: Genaro de Carvalho (1926 – 1971)
Ano: 1950

Inaugurado solenemente em 1952 o antigo Hotel da Bahia, hoje Wish Hotel da Bahia, nasceu como um espaço referência em hotelaria e artes no estado. Desde essa época encontra-se, em um dos seus mais sofisticados salões no andar térreo, o belo painel assinado pelo artista plástico baiano, conhecido pelas tapeçarias, Genaro Antonio Dantas de Carvalho (1926 – 1971), datado de 1950.

Em um cenário que cobre todas as paredes do salão circular, encontram-se algumas das mais expressivas festividades brasileiras apresentadas em diálogo com cores quentes e traçados que lembram obras cubistas e com temática regionalista. De uma extremidade a outra, tons de vermelho, azul, ocre, e amarelo fazem com que o visitante veja a diversidade étnica brasileira e imagine os sons, aromas e rezas, em cantigas perdidas ou perpetuadas ao longo do tempo, em uma experiência sensorial. Cada personagem representa com seus traçados, roupas e poses retratos de um tempo que foram traduzidos por Carvalho em seu maior painel produzido.

Dando as boas vindas, logo a direita de quem adentra o salão, uma mulher com uma travessa com bananas e outras frutas, lembrando as quitandeiras de outrora, dá as boas vindas junto com outro personagem entornando uma garrafa. O cenário em que estão inseridos lembra bem os espaços de cidades do interior, onde muitos se encontravam para colocar o papo em dia, usando suas roupas coloridas com vestidos de chitas e peças em linho. Pequenas casas, igrejas e outras pessoas são inseridas com o intuito de passar profundidade, diversidade e movimento ao painel. É como se todos seguissem para uma grande festa ou procissão, um grande encontro de faces e festividades que também é o Brasil.

Barraquinhas onde se vendia de tudo um pouco, ao lado de um cortejo religioso onde aparece alguma representação de Nossa Senhora, levada em um andor, surgem na frente de uma igreja de traçado antigo inserida provavelmente em alguma cidade ou vilarejo com casas simples. Essa cena, que poderia passar despercebida por olhares menos atentos, está carregada de Brasis, onde homens, mulheres são representados em suas atividades do cotidiano, preparando o local do festejo, lavando os espaços utilizados ou simplesmente sentados segurando uma flor. Um grande “tabuleiro de xadrez” mostrando cenas do modo de viver a vida, com mulheres carregando potes de água, crianças, carroças, coqueiros, homens segurando galos; lembram que por trás de toda festa temos uma expressão popular.

O mar também está presente no belo painel. Especialmente nas cidades banhadas pelo Atlântico, ou com uma Baía, no caso de Salvador e seu Recôncavo. Homens e mulheres desde séculos atrás agradeciam a fartura vinda dos mares e pediam proteção, bênçãos, nos caminhos percorridos no mar. Diversas procissões já percorreram o litoral baiano e ainda hoje (exemplo da Festa do Bom Jesus dos Navegantes e Iemanjá) são característica forte do calendário de comemorações em Salvador. A mais conhecida festividade religiosa baiana, a Festa e Lavagem do Senhor do Bonfim, se originou de uma promessa pós uma tempestade em alto mar. Mar, homens e fé sempre estiveram de mãos dadas.

Na última extremidade do salão duas cenas se destacam, uma pela expressão de sonoridade e a outra pelos contornos repletos de poesia, quase que enigmático. No primeiro caso quatro personagens apresentam suas violas, todos vestidos em tecidos com listras, losangos e bolinhas. No fundo embarcações em movimento cruzam as águas lembrando que o tempo está passando. Olhares suaves e expressões firmes talvez lembrem que é tempo de festejar e de pensar nos passados e amanhãs. Igrejas solitárias, bananeiras, plantações... terras ocupadas ou desocupadas, mas cheias de histórias, unem-se a última grande cena do painel.

Aparece então uma mulher com olhos fixos em um horizonte invisível. Com um olhar suave, em pose de elegância segurando um jarro de cerâmica, abraçando-o com ternura, está usando um belo vestido com listras vermelhas e escuras. Do lado esquerdo um homem segura flores vermelhas, do lado direito outro segura um pacote próximo ao mar. Os três podem representar um pouquinho de toda a síntese da obra, são frutos do desejo, amores, aspirações, da fé e de festas. Todos são representantes de um Brasil colorido por Genaro de Carvalho e os mais de 80 personagens presentes no painel, pintado quando o artista tinha 22 anos a pedido do Governador Otávio Mangabeira (lembrou a viúva Nair de Carvalho), e atualmente tombado pelo Instituto do Patrimônio Artísitico e Cultural da Bahia (IPAC). Genaro também assina outras gravuras que decoram os corredores do Wish Hotel da Bahia.